sábado, julho 22

DIGA LÁ OUTRA VEZ

Organismos juvenis da Europa reuniram em Ponta Delgada, fazendo deslocar a esta cidade também alguns responsáveis políticos pelas áreas da educação, da formação e do trabalho. Intervindo numa das sessões daquele evento, Carlos César revelou que nos últimos dez anos se registou nos Açores um aumento de 1500 por cento de jovens com formação profissional. Os participantes estrangeiros devem ter julgado tratar-se de um erro da tradução simultânea. Caso contrário teriam rido desbragadamente daquela referência percentual. Desde logo, porque uma coisa é a frequência de escolas de formação profissional e outra a habilitação para o exercício de uma profissão. Depois, porque a abertura de diversas escolas onde se ministra esta vertente educativa fez absorver cerca de 30 por cento dos alunos que antes frequentavam o ensino regular. Logo, não há mais gente a estudar nos Açores. E provavelmente não teremos jovens mais qualificados para o mundo do trabalho. Temos, sim, muitos rapazes e raparigas atraídos por um modelo de ensino, regra geral, menos exigente e ainda mais aliciante pelas bolsas de formação que paga aos formandos, através dos fundos comunitários.

terça-feira, julho 18

OLHATVÊ

Carlos César era deputado regional quando declarou, com todo o vigor, que o financiamento das redes de emissão da RTP e RDP nos Açores “não eram vocação nem obrigação do Governo Regional”. Na viragem dos anos 80 para a década seguinte, o investimento que então se fazia naquelas infra-estruturas de comunicação, além de proporcionar aos açorianos o acesso à rádio e televisões públicas, era decisivo no domínio da protecção civil, já que uma eficaz cobertura radiofónica permitia alternativas de contacto com eventuais lugares assolados por catástrofes. Por exemplo, a colocação de um emissor no Pico Alto, em Santa Maria, era, e é, uma forma segura de comunicar com toda a costa sul da ilha de S. Miguel, em períodos de inoperacionalidade dos meios de comunicação instalados na serra de Água de Pau.
Estas e outras explicações que dei, enquanto Subsecretário Regional da Comunicação Social, não convenceram o incrédulo deputado Carlos César.Passados estes anos, o mesmo político mudou de opinião. Agora financia (e bem!) a rede de emissão daquelas empresas públicas de comunicação social. E até já considera de interesse e obrigação regional suportar os custos com equipamentos informáticos e pessoal que ali trabalha, em vez de exigir ao Governo da República o cumprimento das obrigações que tem para com o serviço público de rádio e televisão, também nos Açores.

sábado, julho 15

ENQUANTO A LUZ














... encontra o mar

quinta-feira, julho 6

CARICATURAS

Há precisamente cinco semanas, sem qualquer iluminação de vidente, antevi o domínio do futebol sobre os destinos da Nação. Conhecendo o país que somos, a previsão era fácil e óbvia. Dificilmente uma medida governativa teria rasgo suficiente para fazer esquecer um drible do Ronaldo, um remate certeiro de Maniche e uma defesa de Ricardo.
Dificilmente uma decisão do Banco Europeu teria mais valor do que o contrato do senhor Scollari.
E longe de mim pensar, com tanta antecedência, que os 23 seleccionados levariam tão longe esta euforia nacional. Bastavam-me, então, os 78 jogos que as televisões haviam de transmitir em pouco mais de um mês, mais as emissões em directo dos treinos, das conferências de imprensa, da entrada e saída dos hotéis, dos bares e praças do país inteiro e de todo o lugar onde se concentra a lusa gente.
Como a essa avalanche futebolística se juntavam as festas e os festivais de Verão, facilmente vaticinei a ida dos políticos para férias, antes do calor apertar, pois de boa vontade, o país lhes concedia a folga. E alguns foram. Outos, se permanecem no gabinete, como sempre, ninguém dá por eles.
Alguns, teimosamente e por súbita vocação de serviço público, continuam no seu posto, ainda que afastados dos holofotes televisivos ou remetidos para o fim dos telejornais, fazendo concorrência à curiosidade e ao entretenimento que preenchem esse espaço no alinhamento das notícias.
Acaso alguém notou a saída de Freitas do Amaral do ministério dos negócios estrangeiros? O distinto professor de direito, que fez toda a sua vida política na direita, retirou-se, oficialmente, por motivos de saúde. Ficaram aliviados os socialistas e os diplomatas, uns e outros incomodados pela presença de um corpo estranho.
Entre nós, a odisseia do transporte marítimo continua sem fim à vista. O navio “Ilha Azul” atrasou-se mais de duas semanas, à espera da certificação, para navegar segundo as regras de segurança definidas pelas autoridades marítimas nacionais e comunitárias. Carlos César criticou as ditas autoridades por “excesso de zelo”, em vez de deitar à água (que é como quem diz, demitir) o secretário da economia, responsável por um agitado e turvo concurso público.
De passagem pela Região, o ministro responsável pelo sector das pescas contentou-se com a redução da zona económica exclusiva dos Açores de duzentas para cem milhas. O discurso do ministro deita por água abaixo a algazarra dos socialistas açorianos, feita há pouco mais de dois anos, quando a União Europeia determinou aquela alteração e o PSD liderava o governo da república.
Por entre outras gafes e caricaturas que o futebol vai ofuscando, registo um anúncio com grande antecedência: em 2007, cinco anos depois da data prevista, o cartão de utente do serviço regional de saúde vai ter utilidade. Até lá, as férias, o verão, outros futebóis e outras festas – ou violas e brasileiras, como agora se diz – hão-de entreter o povo.

(Dito hoje na Rádio Atlântida)

segunda-feira, julho 3

CARTÃO E DESCARAMENTO

Prometido por Fernanda Mendes.
Francisco Coelho engordou-lhe a burocracia.
Domingos Cunha exigiu que os utentes o requeressem até ao fim de 2005.
Está prometido que em 2007 vai ter validade na "república socrática".

SUCESSO ESCOLAR À FORÇA

As estatísticas oficiais não desmentem, antes confirmam o declínio progressivo do aproveitamento escolar nos Açores, desde 1996.
A solução administrativa para o caso é, a um só tempo, eficiente e barata. Alegadamente, os alunos libertam-se da tirania da avaliação. Disfarçadamente, os pais são promovidos a especialistas da educação. E generosamente os professores são convidados a aprofundar a democracia dos seus procedimentos profissionais. A legislação que rege (guia, conduz, encaminha?) a avaliação das aprendizagens no sistema educativo açoriano é um contributo ímpar na promoção da mediocridade. Em vez de exigir rigor e critérios de qualidade, incentiva o facilitismo e premeia a indiferença.
Já abordei a temática nesta páginas e se agora volto assunto é pela pertinência do mesmo, no momento em que as escolas procedem à avaliação de final ano dos respectivos alunos.
O Regulamento de Avaliação das Aprendizagens no Ensino Básico contem singularidades que a geografia e a história – a ultraperiferia e a autonomia – talvez expliquem. Assim, no final dos 2º e 3º Ciclos, quando o aluno não obtiver aproveitamento na disciplina de Língua Portuguesa e noutra qualquer área curricular disciplinar, a decisão de progressão “deve ser tomada com, pelo menos, o voto favorável de dois terços dos professores que integram o conselho de turma”, isto é, mesmo sem o consentimento dos docentes titulares das disciplinas em causa. No resto do país o critério é diferente. Obtendo classificação inferior a 3 nas disciplinas de Língua Portuguesa e de Matemática, o aluno só pode transitar por decisão unânime do conselho de turma.
Ao ignorar a importância das competências no domínio da matemática para a qualidade e sucesso formativo do aluno, a generosidade do sistema regional dissimula a insuficiência de competências de muitos estudantes no final dos ciclos de escolaridade. O facilitismo de tais regras traduz-se, por exemplo, no aproveitamento integral de uma turma do 9º ano de escolaridade quando, no contexto dos critérios fixados para o resto do país, sete alunos teriam reprovado e, portanto, a taxa de sucesso escolar seria somente de 71,8%. Além da duvidosa norma que exclui a disciplina de matemática da nuclearidade dos saberes escolares, o Governo Regional também despreza o valor educativo das áreas curriculares não disciplinares, irrelevantes “para efeitos de progressão dos alunos”. Neste contexto, que utilidade se atribui à área de projecto, à formação cívica e às disciplinas do ensino artístico? E que motivação pode encontrar nelas um aluno?
Ainda assim, para acautelar eventuais taxas de retenção, como as verificadas nos últimos dez anos, o Governo socialista aditou àquelas regras a elaboração obrigatória de um “relatório analítico e prospectivo sobre as práticas e estratégias curriculares desenvolvidas e a desenvolver naquela turma” sempre que se registarem reprovações superiores a 10% dos alunos da turma, ou seja, mais de dois estudantes. O relatório, com nítida intenção intimidadora, é submetido pelo conselho executivo da escola “à Inspecção Regional da Educação no prazo máximo de 30 dias após a conclusão das actividades lectivas”.
Com tantos estratagemas é previsível o arrepio do insucesso escolar, quando forem revelados os próximos indicadores estatísticos relativos aos 2º e 3º ciclos de escolaridade. Na etapa precedente o problema foi (administrativamente) resolvido: no primeiro ano não há lugar a retenções; nos 2.º e 3.º anos de escolaridade, “a retenção é uma medida pedagógica de carácter excepcional”, desde que “seja do conhecimento do encarregado de educação e não mereça a sua oposição”. Mas o imbróglio subsiste no ensino secundário onde, na falta de critérios regionalizados, a aferição se faz segundo normas e exames nacionais.
Está tudo dito, não está?

(Escrito hoje no Açoriano Oriental)

sábado, julho 1

200 MILHAS PELO "CANUDO"

ODISSEIA MARÍTIMA

Já quase tudo se disse sobre a operação de transporte marítimo de passageiros e viaturas nos Açores. A odisseia do Ilha Azul, assim se chama um barco vermelho e branco, rivaliza com as epopeias mais famosas da história. Com uma diferença relevante. Aqui a história não é feita das grandezas do homem, mas dos seus desmandos.
Dobrado o Cabo da Boa Esperança, que foi a certificação do navio, já outras tormentas se levantam. Em Santa Maria o “Ilha Azul” não atraca no cais de ferries. Construído vai para quatro anos, aquele molhe estava destinado ao tráfego de passageiros. Mas como muitas outras obras públicas que se vão fazendo entre nós, também o dito cais foi mal projectado, sem visão de futuro e não garantindo condições diversificadas de operacionalidade. Resultado: dinheiro, literalmente, deitado à água. E não é um dinheiro qualquer, mas o que sai dos nossos bolsos, por via dos impostos que impendem sobre os nossos rendimentos.
Não se julgue que os erros de cálculo e o desperdício de dinheiros públicos são coisa rara e que, por azar, apenas bateu à porta dos marienses. Nada disso. Outras obras faraónicas são apanhadas no mesmo desatino. Por exemplo, o cais de cruzeiros, cuja construção arrancou por estes dias, já teve várias alterações ao projecto, nomeadamente para garantir a atracagem de navios de maior porte, que não cabiam nas dimensões inicialmente previstas. Ainda assim sobra uma dificuldade: o molhe não comporta mais de um navio. Nesses dias, quando a procura for superior, como às vezes acontece, os respectivos comandantes hão-de decidir a atracagem atirando uma moeda ao ar. Ou será à água?
Bom. Para que não se diga que falo apenas de exemplos dentro de portas, lembro que os megalómanos estádios mandados construir para o campeonato europeu de futebol também vão dando água pela barba. Veja-se o recinto de Faro/Loulé, cuja manutenção, suportada pelos municípios algarvios, ascende a cinco mil euros diários. E também aqui os desmandos não se confinaram às derrapagens financeiras do custo da construção ou ao previsível sobredimensionamento das instalações. É que, para ironia do destino, o Algarve deixou de ter equipas nos principais escalões do futebol nacional, o que significa, fatalmente, falta de espectadores e das consequentes receitas.A este propósito reavivo a memória dos mais esquecidos: a UEFA exigiu a Portugal construção de seis estádios para esse campeonato europeu; António Guterres, generoso como sempre foi, decidiu a construção de uma dezena. Vendo bem as coisas, tinha razão, é no futebol que está o orgulho nacional. Pouco importam as finanças da Nação, o estado da saúde e a educação do país, somos bons na bola e isso basta-nos. Até ver. Enquanto não batermos bem da bola.

(Dito esta quinta-feira na Rádio Atlântida)